Informações sobre as obras
Guardiãs, 2022
Esculturas em cerâmica
Terra, 2022
Cerâmica e Engobes
190 x 60 cm
Fogo, 2022
Cerâmica e Engobes
183 x 60 cm
Ar, 2022
Cerâmica e Engobes
175 x 60 cm
Na exposição Corpo-Ilha, as Três Guardiãs emergem como entidades que encarnam a ressurreição e a capacidade de perdão, convidando o espectador a explorar o limiar entre o aqui e o lá, entre o corpo, a ilha e o mar, e entre o feminino e a força primordial que emana do oceano. O barro, enquanto matéria, torna-se corpo e gesto, transforma-se no palco onde o mar se eleva e o corpo da ilha surge como um lugar entre o efémero e o contínuo. Cada Guardiã simboliza o ciclo eterno do mar e da vida, reconfigurando a narrativa e conciliando a solidez do enraizamento com a fluidez da existência. Corpo-Ilha propõe uma viagem de recolha e celebração, onde o imparável ritual do tempo se dissolve no vasto sopro do mar, abrindo espaço para novas narrativas que resgatam e questionam a nossa identidade e o nosso lugar no mundo.
Auto-retrato, 2024
Stencil impresso com carimbo manual, linhas de algodão e tintura de anil
[Stencil printed with hand stamp, cotton thread and indigo dye]
78 x 60 cm
O auto-retrato é um gesto de insurgência contra o apagamento. O algodão e o anil não são escolhas casuais: são materiais historicamente ligados a processos de trabalho manual e à diáspora africana, mas aqui tornam-se ferramentas de reinvenção, símbolos de um processo em que me inscrevo e reclamo a minha própria narrativa. A repetição dos traços não é um acaso - é um ritual, um ato de amor e de presença. Estou aqui, visível, inegável.
Corpo Ilha - Três Movimentos, 2025
Movimento primeiro
Video-Performance, HD, cor, som
1’43’’
Corpo Ilha - Três Movimentos, 2025
Movimento segundo
Video-Performance, HD, cor, som
2’30’’
Corpo Ilha - Três Movimentos, 2025
Movimento terceiro
Video-Performance, HD, cor, som
1’26’’
Entre corpo, ilha e mar, inscrevo-me no movimento incessante entre presença e apagamento, identidade e resistência. Aqui, não nasci ilha, tornei-me ilha - a cada gesto modelado contra o esquecimento, a cada traço de barro que transformo em voz. O oceano, ora refúgio, ora desterro, murmura-me histórias de travessia e insubmissão. No seu fluxo ininterrupto, reconheço a persistência das mulheres que vieram antes de mim, a força de quem se recusa a ser definida pelo limite e encontra na maré a promessa de recomeço.
"Trago nas mãos a memória das marés."
Orlanda Amarílis (poetisa cabo verdiana)
Mergulho, 2022
Tríptico fotográfico
Impressão em papel Hahnemühle por processo Diasec
100 x 75 cm [x 3]
Mergulho é um tríptico no qual o corpo e a água se entrelaçam num jogo de refração, fragmentação e transparência. As três imagens capturam instantes de suspensão, nos quais a identidade se dissolve e se recompõe entre a superfície e a profundidade.
Na primeira imagem, as mãos estendidas tocam a água, esbatendo-se no reflexo, num gesto que evoca tanto a entrega como a resistência. Na segunda, o rosto emerge e se distorce sob a ondulação, revelando a tensão entre submersão e afirmação. Na terceira, as pernas irrompem no campo visual, reafirmando a presença corporal no fluxo do oceano, onde os contornos oscilam entre a revelação e a ocultação.
A água transfigura-se, ao mesmo tempo, num relicário de memórias e num manto de sussurros, imortalizando vestígios que oscilam entre a doçura da entrega e a força indomável da resistência. Mergulhar é mais do que um ato físico: é um atravessamento, um rito de passagem, uma permanência efémera gravada na ondulação.
SOBREVIVENTES, 2024
Instalação em cerâmica e engobes
Dimensões variáveis
Potes dispersos como quem inscreve a memória na matéria crua do tempo, como quem traça nos volumes espalhados os vestígios de viagens e silêncio, de lutas femininas, onde a resistência se refaz ininterruptamente. São formas suspensas entre presenças e vazios, corpos que se encontram na sua própria fragmentação. Carregam neles a insularidade que dá forma e que recusa clausuras, essa condição de quem pertence sem nunca ser inteiramente, de quem habita um território incessantemente redesenhado pelo mar.
Na sala, os potes ocupam o espaço à deriva, como marcos de uma geografia afetiva e dispersa. No mar, um conjunto flutua – matéria que se recusa a afundar, que persiste no balanço das ondas, na hesitação entre o desaparecimento e a permanência. Diante destas formas, observamos o ritmo das marés, a cadência antiga de partidas e regressos. O barro, tocado pelo tempo, conserva nas suas fendas o sopro de quem atravessa – ecos de passos antigos, vestígios de mãos que modelaram e partiram, sombras que o vento não levou.
Como a ilha que se ergue entre o mar e o céu, estas formas habitam a tensão entre o que é fixo e o que flui, entre o que resiste e o que se desfaz. E, no entanto, permanecem – na luz oblíqua, na sombra breve, na memória que as sustém. Somos sobreviventes – do barro, da ilha, da travessia infinita entre o que fomos e o que ainda seremos.

Vestido da Artista, 2025
Têxtil
130 x 50 cm
Um vestido suspenso, esvaziado de corpo, atravessado pelo tempo. As manchas de anil e terra são testemunho de gestos acumulados, de matérias que se entranham na pele do tecido como lembranças que recusam apagar-se. Vestido da Artista inscreve-se entre presença e ausência, entre o que se veste e o que se despe, entre o que se guarda e o que se deixa para trás. A sua silhueta vazia sugere uma identidade insular, movida como a linha do horizonte, onde a memória do corpo resiste, mesmo quando o corpo já não está.
SILHUETAS, 2024
Fotografias Polaroid e textos datilografados sobre papel Canson
35 x 28 cm [x 15]
SILHUETAS oferece uma análise profunda da migração, da identidade feminina e da resistência no contexto da diáspora, formulada através de uma narrativa não linear que entrelaça texto e imagem. Através de polaroides montadas sobre papel Canson e intercaladas com textos datilografados, a instalação ecoa as vivências de mulheres na luta diária contra a opressão patriarcal, as condições de migração e a busca incessante pela igualdade.
Ao dispor estes relicários de identidade, SILHUETAS dialoga com a multiplicidade de vivências femininas. Cada silhueta é uma reivindicação de existência, uma narrativa que desafia as imposições do patriarcado e os estigmas da migração. Por meio dos fragmentos textuais e visuais, a obra resgata histórias esquecidas, oferecendo ao espectador uma experiência sensorial e emocional que transcende fronteiras e convenções.
O trabalho transcende a mera representação visual ao transformar o contorno do corpo num espaço de profunda reflexão sobre a questão da cor. Ao olharmos para as nossas próprias silhuetas, seja no estúdio ou durante uma caminhada no parque, na sombra acolhedora que suaviza as formas, percebemos que, por um instante, as distinções desapareciam. Éramos todas iguais: não havia “branco” ou “preto”, apenas uma cor unificada que nos conectava à essência da existência, onde a identidade não se define por rótulos, mas pela experiência partilhada do ser.
Nesse espírito, o projeto ganhou uma dimensão ainda mais rica ao convidar colegas da Escola de Artes da Universidade de Évora — representando diferentes nacionalidades — para retratar esse espaço de igualdade. Num contexto que, muitas vezes, reforça divisões, cada silhueta tornou-se num manifesto de diversidade e de união. Ao registar essas imagens, o olhar para o contorno transformou-se num exercício de ressignificação, onde as barreiras impostas pela cor da pele se desfazem perante a universalidade do gesto e da forma.