ÉUMAVEZ. Artes e Visualidades na Universidade de Évora

EXPOSIÇÃO

Curadoria de Filipe Rocha da Silva

De terça-feira a domingo, 10h00-13h00 / 14h00-18h00 | Entrada livre

Inauguração: 1 de novembro | 16h30

 

No ano de 2025, a Universidade de Évora comemora o cinquentenário da primeira aula após a sua refundação, enquanto Instituto Universitário de Évora (1973), e o quadragésimo quinto aniversário da sua existência contemporânea com a atual designação.

O ímpeto para a (re)criação de uma instituição de ensino superior na capital alentejana deve-se sobretudo à vontade e à visão do ministro Veiga Simão que, em 1973, lançou a base para a criação de cinco novas universidades no país. Não obstante, a estreita ligação entre a recém-fundada universidade e o precedente ISESE – Instituto Superior Económico e Social de Évora, implementado anos antes pelo Engenheiro e benemérito Vasco Maria Eugénio de Almeida e pela Companhia de Jesus, não pode deixar de ser assinalada. Em grande medida, entronca nessa colaboração a profícua e benéfica relação de proximidade e convergência que tem marcado, ao longo de décadas, a interação entre a Universidade de Évora e a Fundação Eugénio de Almeida.

A celebração das referidas efemérides não poderia deixar de considerar, por um lado, a história desta que foi a segunda instituição de ensino superior fundada em Portugal há 466 anos, nem a sua projeção no futuro, assente nas múltiplas gerações de estudantes que nela se têm formado ao longo dos últimos 50 anos, e que nela continuam a desenvolver as competências de que necessitarão no exercício da sua atividade futura.

A Universidade de Évora dispõe de um conjunto de obras de arte, algumas datadas dos sécs. XVII e XVIII, outras contemporâneas. As primeiras provêm, possivelmente, de um esforço de renovação e decoração dos espaços do Colégio do Espírito Santo, que terá resultado na construção do frontão da fachada principal, na azulejaria das salas de aula do Claustro Maior e numa extensa série de pinturas que se encontram atualmente nos corredores do terceiro piso. Por outro lado, e desde os anos 40 do século passado, a Universidade de Évora é depositária de algumas obras artísticas que fazem parte das coleções do Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo. Já as obras de arte contemporânea, expostas em parte na Sala de Docentes, foram adquiridas ou doadas durante os mandatos dos ex-reitores António Santos Júnior e Jorge Araújo. Um outro núcleo integra obras produzidas por técnicos e estudantes da Escola de Artes da Universidade de Évora, fundada na viragem para o séc. XXI, e cuja dinâmica cultural tem sido, nos anos recentes, amplamente reconhecida e apreciada ao nível municipal, regional, nacional e internacional.

A exposição ÉUMAVEZ: Artes e Visualidade na Universidade de Évora resulta, em primeiro lugar, de uma política de valorização do património artístico dessa instituição (ou nela exposto), desde 2024, que tem passado pela inventariação, catalogação e musealização das obras em causa, bem como pela publicação de um roteiro alusivo, que contará com contributos fundamentais de investigadores e especialistas nas respetivas áreas. Esta iniciativa enquadra-se nas comemorações acima referidas e assenta numa profícua parceria com a Fundação Eugénio de Almeida, cujo acolhimento no seu Centro de Arte e Cultura se traduz na primeira mostra pública deste impressionante conjunto de obras, e no seu reconhecimento como coleção de arte contemporânea.

Pela mesma ocasião, pretendeu-se contribuir para a criação de fontes sobre a história da referida coleção, através do registo videográfico de entrevistas com José Alberto Machado, Professor Catedrático Jubilado da Universidade de Évora e Pró-Reitor para a Cultura nas últimas décadas do séc. XX, a cuja iniciativa se deve a compra e/ou cedência de várias obras que integram a exposição; a Arlete Alves da Silva, que trabalhava então na Galeria 111, fundada pelo seu marido, Manuel de Brito, e nos confia as suas recordações sobre o mercado de arte de então; e a António Cândido Franco, escritor, docente aposentado da Universidade de Évora e amigo de Artur do Cruzeiro Seixas, que tornou possível a doação de um extenso conjunto documental e artístico à Biblioteca da referida Universidade.

À Fundação Eugénio de Almeida, e especialmente a Marisa Guimarães, coordenadora do Centro de Arte e Cultura, é devido um agradecimento muito especial, pela visão, cumplicidade, competência, disponibilidade e empenho em levar este projeto a bom porto. Ao Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo, na pessoa da sua atual diretora (e docente da Universidade de Évora), Sandra Leandro, agradecemos a cedência de uma peça-chave desta exposição, o retrato do Cardeal D. Henrique, que habitualmente se encontra exposto na Sala dos Atos. A Filipe Rocha da Silva, docente jubilado da Universidade de Évora e um dos fundadores da Escola de Artes, estamos profundamente gratos pela curadoria da exposição, que constitui garantia inabalável da respetiva qualidade artística. A João Cordeiro, docente no Departamento de Artes Visuais e Design, e a Teresa Maluenga, técnica no mesmo departamento, devemos e agradecemos a realização dos registos videográficos de entrevistas que integram a própria exposição.

Esperamos que a exposição ÉUMAVEZ: Artes e Visualidade na Universidade de Évora permita encerrar com chave de ouro as comemorações do cinquentenário da refundação da Universidade de Évora, dando a conhecer à comunidade, senso lato, as obras de arte desta instituição (ou a ela confiadas), num dos espaços expositivos mais dignos e prestigiados da região e do país, cumprindo simultaneamente os desígnios da Universidade de Évora, da Fundação Eugénio de Almeida e do Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo. Sobretudo, que ela estimule os interessados a olhar, fruir e deixar-se inspirar por um conjunto de obras de arte de superlativa qualidade, contribuindo decisivamente para a valorização desta coleção e para a sua abertura à comunidade em geral, para usufruto de todos quantos queiram e possam visitá-la.

Ana Telles
Vice-Reitora para a Cultura e Comunidade da Universidade de Évora
 



Esta exposição visa reunir algumas obras marcantes de Desenho, Pintura e Escultura que estão à guarda ou pertencem ao espólio da Universidade de Évora. Trata-se da primeira exibição pública destas obras e acontece por ocasião das comemorações da refundação da Universidade de Évora, enquanto Instituto Universitário de Évora (entre 1973 e 1975), que culminam em 1 de novembro de 2025.

Simbolicamente, enquanto Évora se prepara para ser Capital Europeia da Cultura em 2027, a Universidade abre as suas coleções ao grande público, em sinergia com um dos seus interlocutores de relevo, a Fundação Eugénio de Almeida. Ambas as instituições fazem parte da Assembleia Geral da Associação Évora_2027 e partilham objetivos no que respeita à valorização e à promoção da Cultura, enquanto agente transformador das pessoas e das sociedades, tanto na cidade em que se implantam, como no Alentejo e ainda a nível nacional e internacional.

Daí o título desta exposição: É Uma Vez. A distorção do tempo verbal causada pelo inesperado presente, chama a atenção para a inusitada sobreposição entre épocas diferentes num único percurso visual. Através de obras significativas, esta reunião vai confrontar três momentos determinantes da história da Universidade de Évora: o passado notável das artes na antiga Universidade jesuíta (sécs. XVI-XVIII); a sua expansão, aquando da refundação, na segunda metade do século XX; e ainda a explosão criativa, através do que viria a ser a Escola das Artes, na transição para o século XXI, com os olhos postos no futuro.

A exposição incorpora ainda investigação histórica, consubstanciada em documentos biográficos doados por um artista à Universidade e depoimentos em vídeo, determinantes para a origem dos materiais expostos.

Filipe Rocha da Silva
Curador da exposição
 



Filipe Rocha da Silva
Nasceu em 1954, em Lisboa. Em 1972, ingressou na Faculdade de Direito de Lisboa, mas viria posteriormente a dedicar-se às Artes, estudando na Sorbonne, no Ar.Co, na Escola de Belas-Artes de Lisboa, na SACI, em Florença, e no Pratt Institute, em Nova Iorque, onde concluiu um Master of Fine Arts. Enquanto docente, é Professor Catedrático Jubilado da Universidade de Évora, tendo lecionado também noutras instituições, nomeadamente na Madeira, no Porto, na School of Visual Arts, em Nova Iorque, na Arte Ilimitada, que fundou, em Lisboa, e na SACI, em Florença. Desenvolveu investigação artística no CHAIA, no âmbito do qual organizou diversos eventos e publicações.

Tem exposto em vários continentes, em Portugal e em diversos outros países europeus. A sua obra integra coleções de instituições como a Fundação Calouste Gulbenkian, Altice, Banco de Portugal, MUDAS, Museu de Serralves, Governo Regional dos Açores, Universidade da Madeira, Instituto Politécnico do Porto, Unión Fenosa, Studinsky, Benetton e Ferrado Nacomporta I.

Considera-se, sobretudo, um pintor, embora desde 2010 utilize com frequência a lã para criar desenhos têxteis, uma espécie de bordados não tradicionais. No seu trabalho, predominou sempre uma textura minuciosa, quase milimétrica, que sugere a presença de multidões ou de tecidos celulares, criando macrocosmos figurativos de natureza pontilhista. Mais informações e exemplos da sua obra podem ser consultados em www.filiperochadasilva.com

 

António Areal (Porto, 1934 – Lisboa, 1978)
Foi um artista plástico português de formação essencialmente autodidata, cuja obra marcou a transição do Surrealismo para o Gestualismo e uma nova figuração crítica ligada ao Pop e ao Nouveau Réalisme. Desde muito jovem, a sua carreira foi condicionada por problemas de saúde, o que o afastou da formação académica convencional e potenciou um percurso intelectual ligado à Literatura e à Filosofia. Em 1957, ganhou o Prémio de Desenho na I Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian. Viveu um ano em São Paulo (1961-62), onde desenvolveu uma pintura mais gestual. Expôs regularmente em Portugal, e representou o país em importantes mostras internacionais. A sua obra integra coleções institucionais e fez-se objeto de retrospetivas, como a organizada pelo Centro de Arte Moderna / Fundação Calouste Gulbenkian, com itinerância na Fundação de Serralves. A sua produção, breve mas influente, continua a ser estudada e exibida como referência essencial da Arte Portuguesa da segunda metade do século XX.
 

António Charrua (Lisboa, 1925-Évora, 2008)
Desenvolveu grande parte do seu trabalho artístico em Évora, tendo deixado uma obra diversificada que inclui desenho, pintura, escultura, gravura, tapeçaria, cerâmica, azulejaria e vitrais. Com formação inicial em Arquitetura, Charrua expôs regularmente desde 1953. Em 1961, foi bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, o que lhe possibilitou viagens e contactos pela Europa. Em 2001, o Museu de Évora apresentou uma grande mostra da sua obra, e em 2015, a Gulbenkian apresentou a exposição retrospetiva X de Charrua. Teve uma influência determinante no percurso artístico de artistas de Évora como Álvaro Lapa (1939-2006), António Palolo (1946-2000) ou Joaquim Bravo (1935-1990), com quem manteve relações pessoais e artísticas que, nalguns casos, tiveram expressão intensa no desenvolvimento das respetivas práticas. A sua pintura e a sua produção gráfica são frequentemente associadas a um vocabulário de matriz abstracionista, sensível ao gesto expressionista e atento a problemas formais e materiais.
 

António Palolo (Évora, 1946 — Lisboa, 2000)
Autodidata, realizou a sua primeira exposição na Galeria 111, Lisboa (1964). Integrou a exposição itinerante Art Portugais. Peinture et Sculpture du Naturalisme à nos Jours, apresentada pela Fundação Calouste Gulbenkian em Bruxelas, Paris e Madrid (1967-1968). Expôs em diversos museus no estrangeiro e a sua grande retrospetiva realizou-se no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian (1995). A sua obra transitou entre a figuração e a abstração, explorando colagem, geometria, cores vivas e formatos variados, influenciado por correntes como a Pop Art, o Neo-Dada, o Hard Edge. Nos anos 80, verificou-se um regresso ou reinterpretação da figuração. Produziu em vários suportes além da pintura e desenho, incluindo vídeo, cinema experimental, colagem, instalações. Considerado uma referência na História da Arte Portuguesa desde meados dos anos 60, Palolo influenciou sucessivas gerações de artistas. A sua obra integra coleções nacionais e internacionais.
 

Carlos Calvet (Lisboa, 1928–2014)
Foi arquiteto e artista plástico. Formado em Arquitetura na Escola Superior de Belas-Artes do Porto (1957), dedicou-se sobretudo à pintura desde os anos 40, explorando também a fotografia, a serigrafia, a gravura e experiências em cinema. Expôs pela primeira vez na II Exposição Geral de Artes Plásticas da Sociedade Nacional de Belas-Artes (Lisboa, 1947). Também na década de 40, começou a associar-se ao movimento surrealista português, tendo participado na exposição Os Surrealistas, em 1949, ao lado de nomes como Mário Cesariny e Cruzeiro Seixas.
A partir dos anos 60, foi afirmando uma linguagem mais pessoal, marcada por uma estilização metafísica com influências da Pop Art, geometrização das formas, usos simbólicos do espaço, objetos do quotidiano com significado simbólico e elementos oníricos. A sua obra está representada em coleções públicas e privadas, em Portugal.
 

Cruzeiro Seixas (Amadora,1920 – Lisboa, 2020)
Foi um dos nomes maiores do Surrealismo Português e um artista multifacetado, que explorou sobretudo o desenho, a pintura, escultura, a colagem, a assemblage, e também a poesia. Formado na Escola António Arroio, aproximou-se inicialmente de correntes expressionistas e neorrealistas, transitando no final dos anos 40 para o Surrealismo, tendo colaborado com Mário Cesariny e outros membros do Grupo Surrealista de Lisboa, nomeadamente na I Exposição dos Surrealistas, em Lisboa (1949). Na década de 1950, viveu e expôs em Angola, regressando a Portugal em 1964. A sua obra caracteriza-se pelo seu imaginário onírico e surrealista, marcado por traço fino e detalhado, composições enigmáticas e elementos de metamorfose e distorção. Explora o simbolismo, o absurdo e a subversão da realidade, refletindo uma liberdade poética e plástica constante e um fascínio pelo inconsciente. A sua obra foi objeto de retrospetivas e exposições em Portugal e no estrangeiro, e está representada em diversas coleções e museus. A Fundação Cupertino de Miranda possui mais de 400 obras suas, e também a sua biblioteca e arquivo pessoal, por doação do artista.
 

Graça Morais (Vieiro/Freixiel, Trás-os-Montes, 1948)
É uma das mais destacadas pintoras portuguesas contemporâneas. Licenciou-se em Pintura pela Escola Superior de Belas-Artes do Porto em 1971 e, entre 1976 e 1979, viveu em Paris, tendo recebido uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian. A sua obra, profundamente enraizada nas memórias, rituais e elementos populares da ruralidade transmontana, privilegia figuras femininas e explora sobretudo a pintura e o desenho, integrando também azulejaria e ilustração literária. Em 2008, em Bragança, foi criado o Centro de Arte Contemporânea Graça Morais. Em 2024, a artista assinalou ali cinquenta anos de carreira com a exposição retrospetiva Obras escondidas, Obras escolhidas. Continua ativa em exposições e publicações. O seu percurso valeu-lhe várias distinções nacionais e internacionais, entre elas o grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique (1997). A sua pintura afirma-se como uma ponte entre tradição e modernidade, unindo identidade local e linguagem universal.
 

João Cutileiro (Lisboa, 1937–2021)
Foi um dos mais aclamados escultores portugueses, conhecido pela sua abordagem inovadora e pelo uso de mármore. Viveu e trabalhou em Évora desde 1985. A sua formação artística começou na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa (1953–1955) e continuou na Slade School of Art de Londres (1955–1959), onde explorou a técnica da escultura em pedra. A sua primeira exposição foi em 1951, em Reguengos de Monsaraz. A carreira de Cutileiro foi marcada por inúmeras exposições, tanto individuais como coletivas, em Portugal e no estrangeiro, incluindo a Exposição Antológica na Fundação Calouste Gulbenkian (1990). A sua obra pública é particularmente relevante, com peças que se tornaram ícones em várias cidades. Entre os seus trabalhos mais notáveis estão o D. Sebastião, em Lagos (1973), o Busto de André de Resende, em Évora (1986), as Efígies do Marquês de Pombal, no Metropolitano de Lisboa (1995) e o Monumento ao 25 de Abril, em Lisboa (1997). A sua obra está presente em coleções públicas e privadas, e continua a ser um marco na História da Escultura Contemporânea em Portugal, particularmente no modo como rompeu com tradições instituídas, explorou o espaço público, e introduziu uma expressividade formal e simbólica que provoca, questiona e permanece presente.
 

Júlio [Reis Pereira] (Vila do Conde, 1902 — 1983)
Foi pintor, desenhador, ilustrador e poeta, ligado à segunda geração do Modernismo em Portugal. Formou-se em Engenharia Civil na Faculdade de Ciências do Porto e frequentou, como aluno voluntário, a Escola de Belas-Artes do Porto, realizando, mais tarde, períodos de estudo em Paris. Assinou como Júlio as suas obras plásticas, e como Saúl Dias a produção poética. Foi colaborador assíduo da revista Presença, bem como de outras edições contemporâneas do movimento presencista. A sua obra, marcada por um lirismo expressionista com incursões surrealistas e momentos de experimentação, está representada em coleções e instituições nacionais e foi objeto de exposições e retrospetivas organizadas pela Câmara Municipal de Vila do Conde, pelo Centro de Arte Contemporânea do Porto e pela Fundação Calouste Gulbenkian. Paralelamente à criação, reuniu uma notável coleção de artesanato popular, hoje preservada em coleções municipais e museológicas ligadas ao seu legado.
 

Malangatana (Matalana, Moçambique, 1936 – Matosinhos, 2011)
Desde cedo mostrou interesse pelo desenho, começando a explorar essa arte enquanto frequentava a escola da Missão Suíça local. Em 1953, ao trabalhar como empregado de mesa e apanhador de bolas num clube de ténis de Lourenço Marques (atual Maputo) conheceu o biólogo Augusto Cabral, que o incentivou oferecendo-lhe pincéis e tintas, e o arquiteto Miranda Guedes, que lhe cedeu uma garagem para atelier e lhe comprava quadros, regularmente. Malangatana expôs pela primeira vez individualmente em 1961, em Lourenço Marques (atual Maputo), vendendo várias obras e ganhando notoriedade. A sua arte, marcada por figuras intensas, cores vivas, elementos oníricos ou fantásticos e influências de referências africanas, tradicionais, chamou a atenção pela originalidade e força expressiva. Em 1972, realizou a sua primeira exposição individual em Portugal, em Lisboa, na Galeria Buchholz e na Sociedade Nacional de Belas Artes. Paralelamente, envolveu-se ativamente na vida cultural e social do seu país, promovendo a arte como instrumento de identidade nacional. Foi distinguido com vários prémios e condecorações, incluindo o título de Artista pela Paz da UNESCO. Malangatana deixou um legado incontornável para a arte moçambicana e universal.
 

Maluda [Maria de Lurdes Ribeiro] (Pangim, Goa,1934 – Lisboa, 1999)
Foi uma das figuras mais conhecidas e singulares da pintura portuguesa do século XX. Viveu em Lourenço Marques (atual Maputo) a partir de 1948, onde começou como retratista autodidata e integrou o grupo “Os Independentes”, que expôs coletivamente de 1961 a 1963, antes de obter uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian e ir estudar em Paris. A sua obra caracteriza-se por sínteses de paisagens urbanas — janelas, fachadas e vistas de cidade —, e por uma paleta e rigor geométrico muito pessoais, e um uso expressivo da luz. Trabalhou também serigrafia, tapeçaria e design de selos postais, alguns dos quais ganharam prémios internacionais. Realizou exposições individuais de relevo, nomeadamente em Lisboa e Paris, e está representada em coleções públicas e privadas. A sua obra continua a ser objeto de retrospetivas e estudos. Foi distinguida com vários prémios, entre eles o Prémio de Pintura da Academia Nacional de Belas Artes (1979), e foi condecorada com o grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique (1998).
 

Mário Cesariny (Lisboa, 1923 — Lisboa, 2006)
Foi poeta, pintor e uma das figuras centrais do surrealismo português. Estudou na Escola de Artes Decorativas António Arroio e aprofundou estudos musicais com Fernando Lopes-Graça, antes de frequentar, em Paris, a Académie de la Grande Chaumière, onde conheceu André Breton. De regresso a Lisboa, em 1947, participou na fundação do Grupo Surrealista de Lisboa, ao lado de António Pedro, Alexandre O’Neill e José-Augusto França, entre outros. Divergências estéticas e ideológicas levaram-no, no ano seguinte, a criar o grupo dissidente Os Surrealistas, com António Maria Lisboa, Pedro Oom e Cruzeiro Seixas, afirmando uma atitude radical de liberdade e experimentação. Autor de uma vasta obra poética, que inclui Corpo Visível, Pena Capital e Manual de Prestidigitação, explorou o automatismo, o humor e o onírico, recusando convenções e moralismos. Traduziu Rimbaud, Artaud e Novalis, e escreveu ensaios e textos críticos fundamentais para o entendimento do surrealismo em Portugal. A sua pintura, tal como a sua poesia, é marcada pela cor, pelo acaso e pelo absurdo, recorrendo a colagens, assemblages e técnicas mistas que expressam um imaginário livre e subversivo. Figura marginal e visionária, Cesariny influenciou várias gerações de artistas e escritores. Em 2002, recebeu o Grande Prémio EDP de Artes Plásticas e, em 2005, a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade. O seu espólio literário e artístico encontra-se em grande parte na Fundação Cupertino de Miranda, que preserva o legado de um dos criadores mais intensos e libertários da arte portuguesa do século XX.
 

 

Nikias Skapinakis (Lisboa, 1931-2020)
Foi um pintor, desenhador, gravador e ilustrador português de ascendência grega, considerado uma figura incontornável da arte portuguesa do século XX. Começou por expor em 1948, nas Exposições Gerais de Artes Plásticas. Embora tenha frequentado o curso de Arquitetura, que abandonou para se dedicar à pintura, foi um artista autodidata nas artes visuais, tendo mantido uma atividade consistente ao longo de mais de sete décadas. Ao longo da sua carreira, realizou inúmeras exposições individuais e participou em diversas exposições coletivas em Portugal e no estrangeiro. Além da pintura, a sua obra abrangeu, entre outras técnicas, o desenho, a litografia, a serigrafia e a ilustração de livros, como Quando os Lobos Uivam de Aquilino Ribeiro (1958) e Andamento Holandês de Vitorino Nemésio (1983). Foi também autor de um painel para a renovação do café A Brasileira do Chiado (1971) e do painel Cortina Mirabolante para a estação Arroios do Metro de Lisboa (2005). A sua carreira foi amplamente reconhecida e premiada, com destaque para o Prémio AICA/SEC (1990) e o Grande Prémio Amadeo de Souza-Cardoso (2005). Teve várias exposições antológicas em museus de referência como o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian (1985), o Museu do Chiado (1996) e o Museu de Serralves (2000). A sua obra está representada em importantes coleções públicas e privadas.
 

Paula Rego (Lisboa, 1935 – Londres, 2022)
Foi uma das mais marcantes artistas europeias do século XX e início do XXI. É mais conhecida pelas suas pinturas e gravuras baseadas em contos populares tradicionais e histórias infantis. As suas composições figurativas retratam frequentemente figuras femininas enigmáticas no centro de narrativas complexas, inspiradas pelos seus medos e desejos pessoais, além da sua paixão por combater injustiças, particularmente aquelas perpetradas contra as mulheres. Estudou na Slade School of Fine Art, em Londres, entre 1952 e 1956, e fixou-se definitivamente no Reino Unido em 1976, embora tenha mantido sempre uma forte ligação a Portugal. A sua obra, que abrange pintura, desenho, gravura, pastel e criações tridimensionais, cruza memória, folclore, imaginação e crítica social, explorando temas como poder, rebelião, sexualidade e género, luto e pobreza. Paula Rego ganhou destaque no Reino Unido após as suas primeiras grandes exposições individuais na Air Gallery (1981) e na Serpentine Gallery (1988). Em 1990, tornou-se a primeira Associate Artist da National Gallery, em Londres, e em 2010, recebeu o título de Dame Commander do Império Britânico. A sua obra foi alvo de grandes exposições retrospetivas, incluindo as da Tate Britain, em 2004 e 2021, e encontra-se representada em importantes coleções internacionais. Em Portugal, a Casa das Histórias Paula Rego, em Cascais, inaugurada, em 2009, acolhe permanentemente o seu vasto espólio de gravuras, desenhos e estudos preparatórios para obras pictóricas doado pela artista.
 

Raquel Gonçalves (Setúbal, 2003)
Vive na Comporta. Licenciada em Artes Plásticas e Multimédia pela Universidade de Évora, a sua prática artística explora a identidade, o autorretrato e a memória, através de pintura acrílica, desenho em técnicas mistas (riscadores e aguados) e desenho digital. O autorretrato é central, funcionando como forma de autoexpressão e amadurecimento emocional. Privilegia abordagens simbólicas e poéticas que cruzam vivências pessoais e espaços habitados. Na sua prática, tem ainda interesse por instalação, ilustração e artesanato integrando progressivamente novas linguagens.
 

Susana Piteira (Lisboa, 1963)
É licenciada em Artes Plásticas – Escultura pela Escola Superior de Belas Artes do Porto (1990), pós-graduada em Espaço Público e Regeneração Urbana; Arte e Sociedade (2001) e doutorada em Arte Pública, Natureza e Cidade pela Universitat de Barcelona (2018). Foi bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian (1991-1993) e da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (2002-2006). Desde 1987, participa e organiza exposições, conferências, simpósios e workshops nacionais e internacionais, sendo autora de diversas obras escultóricas em edifícios privados e no espaço público, em Portugal. Lecionou na Universidade de Évora (1992-1996; 2010-2011) e na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa (1995-2002). É, desde então, Assistente/Professora Convidada da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Está representada nas coleções do Museu Amadeo de Souza Cardoso, do Museu da Faculdade de Belas-Artes da Universidade do Porto, da Universidade de Évora, do Museu da Guarda, entre outras. O seu trabalho incide na materialidade da escultura, explorando a criação como núcleo poético do objeto artístico, bem como nos impactos da globalização estética em territórios rurais e urbanos e nos processos que sustentam intervenções artísticas nesse contexto.
 

Victor Belém (Cascais, 1938–2015)
Foi um artista multifacetado cujo trabalho percorreu pintura, instalação, vídeo, performance e, nas últimas décadas, a fotografia encenada, descrita pelo artista como foto-ficção. Formado na Escola António Arroio, foi bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian (1961-1963), sob a orientação de Júlio Pomar. Entre 1958 e 1976, desempenhou também funções como criativo e designer em empresas, instituições e órgãos de comunicação social. Exposições regulares desde 1958 e uma carreira marcada pela experimentação e ironia colocam-no entre as vozes significativas das artes plásticas portuguesas do pós-guerra. Victor Belém marcou a produção artística de meados do século XX ao princípio do século XXI, distinguindo-se pela sua irreverência e visão futurista com uma expressividade própria, através do uso das formas, das cores, das texturas e do recurso a diferentes materiais e escalas.  Doou grande parte do seu espólio ao Município de Cascais, e está representado em várias coleções particulares, entidades e museus em Portugal e no estrangeiro.



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