Corpo-Ilha, Jacira da Conceição
EXPOSIÇÃO
Curadoria de Teresa Veiga Furtado
De terça-feira a domingo, 10h00-13h00 / 14h00-18h00 | Entrada livre
Inauguração: 28 de fevereiro | 17h00
O Curso de Mestrado em Práticas Artísticas em Artes Visuais do Departamento de Artes Visuais e Design da Escola de Artes, da Universidade de Évora, orienta estudantes para a investigação artística (arts-based research) centrada nos seus interesses particulares, e para a exploração criativa dos instrumentos conceptuais, formais e tecnológicos, do complexo território da arte contemporânea. Na exposição Corpo-Ilha, Jacira da Conceição, no espaço Atrium do Centro de Arte e Cultura da Fundação Eugénio de Almeida, apresentam-se alguns dos trabalhos mais relevantes desenvolvidos por Jacira da Conceição (Cabo Verde, 1990), artista visual, estudante finalista do curso de mestrado e investigadora colaboradora do CHAIA-Centro de História de Arte e Investigação Artística da UÉ. Nesta exposição, os seus projetos criativos tomam formas diversas que vão da cerâmica à videoperformance, fotografia, instalação e texto, funcionando o espaço Atrium como um laboratório experimental onde é ensaiada a sua disposição e configuração.
A representação dos corpos e das vivências de mulheres negras, por meio de corpografias discursivas e visuais do feminino, envolve sempre riscos na medida em que essas figurações encerram necessariamente em si múltiplos sentidos que dificilmente podem ser descartados por completo e não reativar as fantasias e imaginários coloniais do Sujeito negro como Outra/o exótico. Não é possível compreender o corpo feminino enquanto significante neutro, esvaziá-lo dos significados que lhe estão agregados, da intolerância e preconceito da racialização, assédio e objetificação, entre outros. Todavia, os signos e os valores existentes podem ser alterados, como é demonstrado na obra de Jacira da Conceição onde o corpo feminino, por meio do olhar crítico e desmistificador da artista, é foco potencial de novas narrativas de resiliência, coragem e agenciamento, imprimindo na sua arte subjetividades falantes e autodeterminadas, donas das suas vidas e dos seus corpos.
Nas palavras da artista:
Sou mulher e percorro as ruas da cidade carregando um pote de barro à cabeça. Será que me vês, será que te desperto a atenção, será que alguém se junta à caminhada? Como te sentes no teu corpo ilha? A insularidade que carregamos como lugar interior, agita a ideia da forma e do corpo, colocando em causa o que é considerado normal. No (des)equilíbrio entre o presente invisível e o futuro imprevisível, existe a mulher libertadora que abre caminho ao porvir (Conceição, 2023).
A insularidade surge na obra da artista não como um destino que condena cada mulher cabo-verdiana ao isolamento, mas como um espaço possível de resistência, partilha e solidariedade. Um corpo feminino representado de modo isolado é apenas uma ilha, um contorno solitário, um volume em barro à parte, mas quando mostrado em grupo converte-se num arquipélago corpográfico de silhuetas e cerâmicas que despontam da terra e do mar. Ao representar as mulheres enquanto coletivo, para além de fronteiras geográficas ou de língua, a artista tece redes de cumplicidade, sororidade e empatia que intensificam a universalidade das vivências, vozes e gestos, recusando a invisibilidade, o silenciamento e a opressão.
Aos visitantes, deixamos o desafio para que estabeleçam novas e imprevistas conceptualizações, questionamentos, pontos de sintonia e contraste entre a diversidade de propostas e eixos estéticos, sociais e políticos desta exposição.
Teresa Veiga Furtado, fevereiro de 2025
JACIRA DA CONCEIÇÃO
Nasceu em 1990 na localidade de Chão Bom, Ilha de Santiago, Cabo Verde. Iniciou o seu percurso nas práticas da cerâmica através da relação que estabeleceu com a olaria tradicional Cabo Verdiana. Em 2009, viajou pela primeira vez para fora de Cabo Verde. Durante um ano, percorreu, de bicicleta, o continente Sul Americano. No estado Brasileiro do Maranhão, residiu no Quilombo de Itamatatiua, onde contactou com as ceramistas locais, aprendendo e partilhando técnicas e conhecimentos que influenciaram as suas obras posteriores. A sua prática artística explora questões de identidade, auto-representatividade, insularidade e feminismo, incorporando materiais e formas associadas à arte cabo-verdiana.
TERESA VEIGA FURTADO
É artista, Professora Associada no Departamento de Artes Visuais e Design da Escola de Artes da Universidade de Évora (DAVD/EA/UÉ) e membro integrado do Centro de História de Arte e Investigação Artística (CHAIA/UÉ). As suas áreas de investigação são a Arte Multimédia, Estudos de Género e Arte Social. Em 2023 concluiu Tese de Doutoramento em Arte Multimédia na FBAUL, intitulada "Net art e igualdade de género: cocriação com mulheres de casas de abrigo", e em 2014 em Sociologia, na NOVA FCSH, intitulada "Videoarte de Mulheres: Nossos Corpos, Nós Mesmas". Em 1998 concluiu o Master in Printmaking no Royal College of Art, Londres e em 1992 a licenciatura em Pintura na FBAUL. Desde 2008 que participa na co-organização de conferências internacionais como “Género na arte de países lusófonos”, 2017 na NOVA FCSH, e em curadoria de exposições como "Vídeo e Género", no âmbito do ciclo "Gender Trouble" no Teatro Maria Matos, Lisboa, 2012, e "Género na Arte", com Aida Rechena, no MNAC-CHIADO, 2017-18 (Prémio APOM-Associação Portuguesa de Museologia 2018). Desde 2018 que integra o coletivo Digitálias, um coletivo de mulheres artistas da Associação Ser Mulher, em Évora, no âmbito de projeto de investigação artística do CHAIA.
https://home.uevora.pt/~tvf
Parceria:
