Embora a origem do Paço de São Miguel remonte à Idade Média, da edificação desse período poucos vestígios se conservam em resultado da destruição de que o espaço foi alvo na sequência dos confrontos ocorridos durante a crise de sucessão ao trono de 1383-85 entre os partidários de D. Leonor Teles e os de D. João, Mestre de Avis, futuro rei de Portugal.

A existência deste edifício tal como hoje o conhecemos, em termos patrimoniais e arquitetónicos, está associada à história de duas famílias cuja presença no Páteo de São Miguel se encontra separada por cerca de cinco séculos: os Condes de Basto (ou Castro das Treze Arruelas) e a família Eugénio de Almeida.

À primeira destas famílias, que aqui residiu entre o final do séc. XV e a primeira metade do séc. XVII, deve-se quer a importante campanha de obras do século XVI que conferiu ao Paço de São Miguel uma configuração muito próxima à atual, quer a encomenda do extraordinário conjunto de frescos quinhentistas que reveste os tetos de algumas das salas, de temática profana, da autoria dos pintores Francisco de Campos, Tomás Luís e Geraldo Fernandes de Prado.

Os Condes de Basto, pertencentes à família dos Castro das Treze Arruelas, cujas armas se encontram nos frontões de ambos os portais à entrada do Páteo de São Miguel, foram designados no século XV pelo Rei D. Afonso V Capitães-mor da cidade, estabelecendo a sede da capitania e a sua residência no Paço de São Miguel que lhes foi doado como reconhecimento dos serviços prestados à coroa nas campanhas do norte de África e na Batalha de Toro.

A reedificação do Paço de São Miguel e as obras de ampliação e reestruturação de que foi objeto durante este período visaram conferir ao edifício a imponência e beleza arquitetónica que refletisse a crescente riqueza patrimonial e o prestígio político e social alcançado pelos Castro.

Esta manifestação do seu poder e estatuto económico era particularmente sensível em Évora que, desde o limiar do século XVI, se assumira como um importante foco cultural da Península Ibérica e era considerada a segunda cidade do país, como o comprova a frequência com que contava com a presença do Rei e da Corte. Registe-se, aliás, que a campanha de obras de 1570 promovida pelo 3.º Capitão-Mor da cidade, D. Diogo de Castro, teve como objetivo conferir ao espaço a dignidade necessária para receber o Rei D. Sebastião que aqui residiu na primeira metade da década de 70 do século XVI durante o período que frequentou as aulas da Universidade de Évora, fundada pelo seu tio-avô, o Cardeal D. Henrique.

Na sequência do desastre da Batalha de Alcácer Quibir, de que resultou a morte do Rei D. Sebastião, uma crise de sucessão ao trono e a perda de independência do reino para Espanha, os Castro das Treze Arruelas tornaram-se fiéis ao novo poder e à Dinastia Filipina, chegando a ser vice-reis de Portugal em nome da coroa espanhola. O reconhecimento da sua lealdade à causa de Espanha refletiu-se na concessão do título de Conde de Basto a D. Fernando de Castro por parte de Filipe II, em 1583, aquando da sua estadia no Paço. É por esta razão que o Paço de São Miguel é também conhecido como Palácio dos Condes de Basto.

Com a Restauração da Independência e a subida ao trono de D. João IV, que deu início à Dinastia de Bragança, a família dos Castro das Trezes Arruelas cai em desgraça e é obrigada a retirar-se para Espanha. Apesar de, nos séculos seguintes, o Paço de São Miguel ter sido palco de alguns acontecimentos associados à História de Portugal e ter recebido personalidades de relevo, como a futura rainha consorte de Inglaterra, D. Catarina de Bragança, o edifício atravessa uma fase sombria responsável pelo avançado estado de ruína em que chega ao século XX.

À segunda família, a família Eugénio de Almeida e em especial ao Eng.º Vasco Maria Eugénio de Almeida, deve-se, no século XX, a profunda intervenção de conservação e restauro de todo complexo de edifícios do Páteo de São Miguel que se prolongou por cerca de 15 anos. Vasco Maria Eugénio de Almeida adquiriu o Páteo de São Miguel em 1957 com o objetivo de aí fixar a sua residência durante as estadias em Évora, instalar o Arquivo e Biblioteca da família e estabelecer a sede da Fundação Eugénio de Almeida, que veio a criar em 1963. Outro motivo para a aquisição deste espaço foi corresponder ao apelo das autoridades locais sem os meios necessários para proceder, à época, à recuperação do edifício, classificado como Monumento Nacional desde 1922.

Paço de São Miguel, 1958

Paço de São Miguel, 2013.
© Jerónimo Heitor Coelho / Fundação Eugénio de Almeida

Para além dos graves problemas estruturais apresentados pelo edifício, a longa campanha de obras de conservação e restauro, iniciada em 1958 sob orientação de Vasco Maria Eugénio de Almeida em estreita colaboração com o Arquiteto Rui Couto, revelou elementos de grande valor arquitetónico encobertos pelo sedimento das intervenções de que o espaço fora alvo desde o século XVIII. Foram desentaipadas as galerias quinhentistas e as janelas em estilo manuelino-mudéjar do primeiro piso, demolidos tabiques que compartimentavam os antigos salões e a loggia, colocados a descoberto portais góticos e replantada a vegetação do jardim, recuperando a essência do horto de recreio do tempo dos poderosos Condes de Basto. 

A intervenção implicou igualmente o realojamento de 15 famílias que residiam nos diferentes espaços do Páteo de São Miguel, e da Sociedade Recreativa e Dramática Eborense, que tinha a sua sede no Paço de São Miguel. A aquisição do Paço de São Miguel está ainda associada à venda ao Estado, em 1947, do Palácio de São Sebastião da Pedreira, residência principal da família Eugénio de Almeida em Lisboa, e à consequente necessidade de encontrar um destino para os bens móveis daí provenientes.

Encontramos, por isso, reunidos no Paço de São Miguel uma parte dos utilitários domésticos, do mobiliário e das artes decorativas utilizados pela família Eugénio de Almeida ao longo de quatro gerações nos seus diversos espaços de residência. Trata-se, neste sentido, de um património cuja aquisição não tem subjacente um espírito de colecionador, mas que é o resultado de heranças familiares ou da compra pontual de objetos, determinada por necessidades funcionais da vivência dos espaços, orientada pelo gosto estético dos seus residentes em cada época.

Adquiridos e legados de geração em geração, estes bens evocam a vivência e o uso quotidiano que deles fizeram não apenas o Eng.º Vasco Maria Eugénio de Almeida e a sua mulher neste espaço, mas eles próprios e os seus antepassados nos séculos XIX e XX noutros locais de residência da família por onde estes objetos passaram. O Paço de São Miguel é também hoje, por esta razão, um espaço de memória da família do Instituidor da Fundação. Estes são alguns dos espaços que se podem visitar.



Neste vídeo pode percorrer em breves minutos a história do Paço de São Miguel, desde a Idade Média, em que foi pousada dos reis de Portugal até ao século XX em que as obras de conservação e restauro empreendidas por Vasco Maria Eugénio de Almeida permitiram resgatar este Monumento Nacional da ruína